21 de março de 2011

CASA PRÉ-FABRICADA



“Abre essa janela - primavera quer entrar, pra fazer da nossa voz uma só nota” Los Hermanos
Eu tinha certeza que aquela saudade ia, em algum momento, me matar. Sem que eu sequer sentisse ou soubesse que tinha morrido daquilo. Seria algo como morrer dormindo. Uma doença contagiosa e que se multiplica repentinamente dentro de quem sente – sem que se entenda a força de destruição em massa das esperanças que tem a dita doença.
E a única maneira de se sentir bem que o saudosista encontra, é ficar só para relembrar para alimentar cada vez mais aquele sentimento de ida sem volta. O desapego é uma opção que não convence muito. E cada detalhe, que para qualquer outro livre deste praga passaria despercebido, para o adoentado é mais um sinal... Um motivo para reatar os laços com aquelas lembranças tão doloridas.
E quanto mais se pratica, mais real ficam as lembranças. De repente vem um cheiro, que estava na lixeira mental do passado. E assim, técnicas vão trazendo o barulho das folhas secas sendo levadas pelo vento, o barulho dos sorrisos e a textura do cabelo vão surgindo. E cada vez mais a vida real deixa de ser interessante - o interessante é “viver” naquele mundo, em VHS, rebobinando a fita com o intuito de não enlouquecer, dando a loucura todo alimento necessário.
Senti tanta saudade, nas minhas noites insones e ainda mais nas de sono profundo... A moldura do meu quadro eram teus gestos, tua doçura e teu olhar apaixonado para qualquer pequeno gesto meu. E assim os ponteiros passavam e eu parada em um tempo que não tinha delimitação clara - passado que era presente, presente que parecia não ter futuro.
Afundei-me na poltrona e assisti várias vezes às cenas cansadas geradoras da minha gigantesca saudade, que cada vez mais me abraçava e consumia-me com seus longos braços de polvo. Eu presa - por livre e espontânea vontade. E tudo isso, meu bem amado, é amor. Amor por quem estava distante, por quem estava a mil léguas submarinas em outros braços.
Eu nem queria ir a tua busca. Afinal, não há como controlar o que está lá esperando para ser vivido. Era mais confortável, te ter aqui no meu mundo. Eu diretora de nossa película, onde ninguém mais poderia invadir ou meter o dedo... Era eu e você, enquanto eu brincava de Salvador Dalí. E, por fim, você retornou.
Ananda Sampaio**

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