7 de setembro de 2011

1 Dia


O sol me acordou como patrão que bate à porta do empregado todas as manhãs. E eu levantei pensando no quão longo seria o dia que se alinhava a frente como se fosse minha sombra. Vigiei o relógio, cronometrei meu banho e antes de entrar embaixo do chuveiro fiz o sinal da cruz. Com uma intenção intuitiva de proteção.

E todos os dias juntos somam apenas um dia.

De manhã eu nasceria à tarde floresceria e na madrugada morreria. Em um dia contém toda uma vida. Desde as moedas que serviam pra comprar o lanche da escola ao diário onde aprendi a confessar minhas iniciais descobertas, com apenas uma volta ao sol.

Até a decrepitude do corpo caberia num final de tarde de domingo. São horas que se acumulam cada vez mais rápidas. A infância passa num piscar de olhos, a adolescência numa troca de olhares apaixonados, a maturidade no parto do primeiro filho e a velhice em um gole de água para tomar um comprimido.

E assim, a vida se desenha, como as montanhas de um eterno esboço infantil, frágil. Com pontas soltas no ar, desenhadas pelo vento, embaladas pelo mar. E quando o corpo não responde como antes e se é obrigado a uma condição cada vez mais inerte é que se apercebe que qualquer vida daria um livro.

E que em todo livro cabem várias vidas. E tudo se torna relativo, matemático, causa e efeito. Como se a vida fosse uma conta: somar, subtrair e dividir. E ao contemplar todas as horas vividas intensamente é que se percebe que uma vida inteira – caberia em 24 horas. Que muitas vezes se passa a vida inteira a espera de apenas um momento, de apenas um encontro, de apenas uma palavra. E todos os momentos mágicos , as palavras certas e a pessoa sonhada somados repousam no bater da asa de um beija-flor.

Ananda Sampaio***

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