11 de setembro de 2011

Estela, estrela solitária



"Deixe-me ir
Preciso andar
Vou por aí a procurar
Rir prá não chorar
Se alguém por mim perguntar
Diga que eu só vou voltar
Depois que me encontrar..." (CARTOLA)


Estela era um enigma. Não fazia escândalos, não ria alto e muito menos perdia a calma. Tinha pleno controle dos nervos. Perdia muito tempo caminhando rumo a larga e infinita avenida do autoconhecimento. Não se importava em combinar suas roupas, em parecer elegante. Vagava pelo mundo como se nada realmente merecesse sua atenção e desprendimento.

Ao contrário de Estela o seu apartamento jamais pareceria aos olhos de um estranho, impessoal, era repleto de fotografias, quadros e objetos peculiares. Sentada sozinha frente ao espelho esta moça gastava uma quantidade absurda de tempo. Encarava-se por horas a fio. Na tentativa de descobrir-se, de navegar nos mares sombrios do seu eu.

Às vezes encontrava tanta tralha guardada, que as lágrimas eram inevitáveis. Tentava se autossanar, curar as dissidências com o silêncio da própria voz. Como se fosse possível viver assim...

Estela nunca saía da rotina.

Não tinha amigos, embora sua caixa de correspondência parecesse vomitar tantas cartas abandonadas. Ela guardava segredos. Talvez um amor a tenha destruído - pensavam os vizinhos. Outros diziam ainda, que ela teria sido abandonada no altar, outros que não tinha família e que teriam todos morrido num acidente mais que trágico.

Estela via sob os pés inúmeras sombras. E pensava consigo:

- Meu Deus, isso tem que mudar.

A vida não volta; fato. Mas, existem passos que jamais se apagam. Decisões que são mais imutáveis que outras. E parecemos caminhar cada vez mais sozinhos, arcando com o peso de tudo que fomos e não do que seremos. O passado nos pesa às costas, o futuro flutua a nossa frente. E não sabemos de que é feito.

Contudo, não precisa dizer isso a ela. Estela o sabia muito bem. Ela não tinha sido abandonada, mas era sim, a desertora. Deixou pra trás alguém que amava demais porque era medrosa. Receosa em entregar a alguém a chave do enigma que carregava. 

O arrependimento doía até as margens, chegava à pele. Era egoísta demais para dividir com o outro todos os dias que viriam. Não queria olhos eternamente atentos sobre si. Agora experimentava o sabor de uma solidão segura e finalmente entendeu o que Milan Kundera quis dizer: “nenhum homem poderá servir de idílio a outro homem”. Amar é assumir riscos.

- E eu nunca estive preparada – deduziu Estela.

Ananda Sampaio***

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