14 de abril de 2014

Os brincos

As duas conversavam no banheiro. O sol batia no basculante e anunciava um dia novo em folha chegando, a luz da manhã, delicada e sutil iluminava tudo sem ferir os olhos. Pois esta é uma terra de muito sol.

Sobre a pia, vários porta jóias genuínos e outros inventados. Objetos desvirtuados- copos de azeitona, de doce com tampinhas coloridas, objetos disfarçados.

A mais nova disse:

- Vó, esse seu porta jóia é tão antigo.

Disse enquanto apontava para um de gesso em formato de presente. Branco, com laços dourados.
A mais velha diz:

- É mesmo, Ana. Esse é antigo, só lembro dos teus dedinhos magricelas catando meu brincos, anéis... junto com a Márcia. Vocês eram terríveis.

Disse a senhora, numa voz de lamentação saudosa. E continuou:

- Às vezes eu encontrava um par no chão do quarto outro no chão da cozinha, saía catando por aí a bagunça de vocês. Sinto muito por ter brigado tanto com vocês por isso...

- Mas, Vó a senhora nem brigava de verdade. Eu nem lembro de alguma vez...

Disse a neta enquanto passava filtro solar sobre os braços.

- Minha filha, isso tudo que a gente passa a vida brigando... é tanta besteira. As plantas do terraço que vocês quebravam jogando bola, o excesso de açúcar no café ou meus brincos, bolsas e tamancos que vocês brincavam.  Por que a gente demora tanto a aprender?

- Porque só sabemos vivendo, Vó.

- Hoje eu percebo como era bom minha casa cheia de gente. Mesmo que algumas coisas estivessem fora do lugar. Era bom saber que sempre tinha alguém na porta ao lado. A gritaria de vocês, os canos quebrados... Quando a gente envelhece percebe que isso tudo foi bom. Faz parte da vida, minha netinha.

Saíram as duas do banheiro, sorrindo. E o pensamento ficou ali martelando na cabeça daquela moça, a mais novinha.

Ananda Sampaio***


Um comentário:

Lucas Barreto disse...

Que maravilha!