9 de dezembro de 2014

Cena


A vida bem que podia ser como aquela cena, aquela das crianças numa tarde de sol na praia chupando picolé. Um quadro bonito e sutil. Observo enquanto resmungo pra mim as tarefas do dia seguinte e lamento as obrigações que abandonei.

Culpa, somos quase sempre movidos por culpa.

A roupa que não está apropriada, o cabelo que está me envelhecendo, a apostila que tenho que ler, os cães abandonados esperando por alguma ajuda... Parece que o mundo está sempre esperando. E as tarefas não acabam, acerta-se de um lado, despenca do outro.

A gravidade que impede o crescimento das asas – os pontos que encerram as frases e as virgulas que falsamente prolongam. Os acentos não correspondem ao real. Ajuste daqui, ajustes dali. E sobram mal entendidos.

Andar descalço é melhor do que andar calçado. Os pés doem, mas não há nunca o medo de perder – porque pés descalços são apenas pés descalços.

E volto a dizer e pedir:

-Um picolé, pés descalços e um sol de fim de tarde na praia.

Ananda Sampaio



Nenhum comentário: