3 de novembro de 2015

Desacordo




Descobri muitas coisas, mas a maioria delas eu não posso contar. É como se montanhas tivessem desabado e fosse possível presenciar a chuva voltar para o céu. A cada descoberta um grão do mar que sou, muda de lugar. Posições se invertem. É muito para quem não sabe de quase nada como eu.

Quero dizer, não quero calar. Mas as palavras escorrem dos meus dedos como água, evaporam e partem para dentro de mim. E lá eu já não posso mais alcançá-las. Visto o meu jeans surrado, mais velho e feio porque é mais fácil. Não consigo me deter tanto em escolhas desimportantes.

E quando tento colocar a palavra sou só silêncio retumbante. Ondas abstratas invadem e compactam tudo; abro a caixa que guardei todas as coisas e ao levantar a tampa percebo que lá não há nada. Como um caminho que se desfez junto ao caminhar, como o retrato antigo no qual não me reconheço mais. Estaca zero.

Começo mais uma vez. Cato um pouco daqui, junto com o que me entregam ali e não sabendo catalogar empurro para dentro do armário. Guardado, trancado está. Mas desaparece e todo o refazer deve ser iniciado.

Assim são as mudanças, assim são as revoadas dos pássaros que tendem a ir e vir. Até o dia que não retornarão mais. E se desfarão junto comigo num pôr-do-sol aviltante e descabido. Eu sou o pôr-do-sol no meio da manhã. Essa coisa toda descompassada, fora de hora e latente. E isso ninguém vê [melhor pra mim]. Na verdade eu deveria ter sido bailarina, lamento muito.


Ananda Sampaio

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