18 de junho de 2013

Mãos sobre a mesa do bar

Para Lygia Fagundes Telles



Tinha se partido – embora não soubesse o quê. Conseguiu percebê-lo estilhaçado sobre o chão da cozinha antes de sair de casa. No peito um lamento ecoava, e muitas coisas não eram como imaginava.

- Será que me enganei tanto assim?

- Eu te avisei, desculpa dizer isso...

-Não sei se não quis ver ou se tudo estava claro demais e eu tenho olhos cegos. Lamentou a descoberta daquela deficiência desconhecida.

- Amiga,  amor é assim mesmo. Tem dessas coisas, inexplicáveis.Entramos numa roubada rindo, como se fosse um parque de diversões. Nem sei te dizer se alguém é mesmo culpado. Ou estamos todos tão desesperados que enfaixamos os olhos por vontade própria.

- Mas, eu tinha certeza que era amor e que era recíproco. Não pensei nunca que algo tão pequeno ou não tão grande fosse suficiente pra nos separar.

- Simplesmente, o tempo acabou. É assim que tento encarar, o tempo de vocês acabou. Já pensou se tudo na vida for mesmo cronometrado?

A moça da dor com as mãos postas uma sobre a outra na mesa de madeira do bar, com jeito e alma de luto travava os ouvidos. Tudo que não queria era ouvir as loucuras da amiga. Não conseguia entender porque resolvera abrir-se logo com ela.No fundo gostava das explicações diáfanas e sinceras que ela sempre encontrava pra não vê-la triste.

- Eu só desejei uma afirmativa. Sonhei que ele me levaria de braços cruzados além de tudo e de todas essas coisas pequenas que as pessoas arranjam para isolar o amor. Como se o mundo fosse feito apenas de casais perfeitos, simétricos, unicolor. Não aprendemos a amar, ainda.

- Aprendemos, mas nem sempre estamos pronto pra ele como imaginamos que estamos. Vestimos nossa melhor roupa, saímos para a noite, com o melhor perfume. Tudo porque estamos prontos para o amor. É como disséssemos desesperadamente que estamos de porta aberta. Como se implorássemos por um momento de verdade. Que nos trague e faça de repente a vida ter sentido. Mas ele só vem quando quer, não adianta disfarces ou fingimentos. Ele sabe a hora e quando vem não pede licença e nunca estamos com a nossa melhor roupa, nem de armadura.

- Mas, quando estaremos prontos? Eu estou, sempre estive. Tanto que me agarrei com tudo a ele. Dei tudo, “queimei meus barcos” como diz o Chico. Pra acabar só.

- No amor não se dança só, querida. Só se dança a dois.

A boca fechou-se retesando tanta verdade. As mãos não formavam mais o montinho, agora postas lado a lado sobre a mesa. Não tinha mais cartas a esconder. O jogo estava claro.

- Mas, por favor, sem esse negócio de perdedor.


Ananda Sampaio***

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