Faz tempo que não venho aqui. Faz
tempo que não relato uma experiência, que não descrevo uma sensação perdida de
um dia qualquer – me distanciei das palavras e minha alma não serviu de filtro
para as coisas do mundo que me assaltam. Fato é que não posso mais ignorar as
circunstâncias que me rodeiam, nem a mim como pessoa eternamente incompleta,
aleijada.
Sinto-me até feliz com isso – há um
espaço vazio que ouso preencher com o que vier de graça, com o que a vida me
dá. Porque assim são os dias que correm, como as sobras sob os pés. A impressão
é que alguns parcos fatos da minha vida remota estarão comigo até o dia do meu
último suspiro. Construímos todo o resto da vida em cima daqueles momentos, que
duraram milésimos e que serviram para definir tanta coisa dentro.
Um caminho, um córrego sinuoso
que irá conduzir a vida – que irá premeditar a direção emblemática que sempre
segue e nunca morre. E eu disse pra minha amiga, numa mesa de bar, onde toca
uma música legal:
- A vida não fácil, crescer não é
fácil e envelhecer é mais difícil que tudo.
E não é sobre os vincos que
aprofundam os traços do meu rosto ou sobre as veias das minhas mãos cada vez
mais saltadas, delirantes. É sobre o remelexo interno, esses muros que caem, as
mãos que se separam e as verdades que se rompem. Na verdade, tudo isso é sobre
cilada.
As palavras, as promessas, as
pessoas, o coração, o tempo e as ondas – é sobre equilíbrio. A fé que não pode
se abalar, o amor que precisa viver para não morrer. É sobre já não ser mais ou
já ser o outro.
É sobre cegar, é sobre as linhas
imaginárias que traçamos que nos distanciam que nos amortecem que nos
descarnam. É sobre não saber nada. É sobre ter medo. Você me entende?
Ananda Sampaio
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