10 de junho de 2014

Amor do tipo líquido


Usada, estirada, espichada, aberta ou fechada. Quase sem A, quase sem O. Roma de trás pra frente – as outras são bárbaras. Esgarçada, desbotada, ressequida, esturricada – amarelada. Sem remédio, sem hora, sem dia.

Banalizada, bandida. Ressignificada, cansada.

É a palavra amor. 

Quase sem M ou R. Dita por qualquer boca de peito vazio. Dita sem dor ou sem riso. Amor, líquido, sem cor, sem cheiro.

Amor, palavra quase doente. Domesticada.

Amor ali, acolá. Como se nascesse de qualquer chão, como se brotasse de quaisquer coração.

Amor, palavra quase morta. Embora seja fácil encontrá-la por aí.

Amor, palavra sem som. De tão comum já não surpreende, já não enlouquece.

O amor virou são, meu Deus. Que mundo louco!

Desmantelou-se. Ai de Julieta, ai de Romeu.

Amor está sem drama, corre nos coloridos  campos do qualquer.

Não está mais nos olhos da columbina, pulando triste o carnaval dos dias de ressaca sem fim.

O amor não mais adoece. O amor acabou-se e a palavra morreu na boca, na boca que disse sem senti-lo, como se fosse bom dia, como se fosse boa tarde.

Sem cerimonia, pompas ou coração saltitante. 



Ananda Sampaio
***

Nenhum comentário: