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Hoje acordei com vontade de
correr. Alçar meu corpo numa corrida intensa e atravessar todas as fronteiras.
Especialmente, aquelas que delimitei. Aquelas
que pintei e defini. Meu corpo não teria limites e não seria magrelo e
desarmado como tem sido até agora.
Vou riscar e rabiscar todo o
mapa, pensei.
A casa respirava junto comigo – o
meu quarto se contraia e descontraia como um pulmão. No ritmo exato da minha.
Quase acordando, mas ainda dormindo.
E desde então, tudo mais parece
ter vida. Os livros que mudam de lugar e se enfileiram por afinidade, a
vassoura que muda de lugar, meus óculos que estão sempre a esconder-se. E assim passa-se o dia. Numa brincadeira de
esconde-esconde.E talvez um dia eu volte a ser
criança, intuo. E tudo mais, inclusive as bonecas que não tenho mais, saiam do
lugar sempre que eu der as costas (aquela brincadeira de estátua).
A vida parece um fluxo inteiro,
intenso. Nós inventamos de picotá-la. E nós inventamos que temos que crescer.
Por quê?
Inventamos um monte de coisa,
dentre elas a fronteira e o limite. Cercamos nosso território e diminuímos nossas
possibilidades. Porque temos medo das mudanças, temos medo de mudarmos, temos
medo de admitir que nem sequer sabemos quem somos. Nós somos invenção – nós somos
as memórias que enfeitamos e um monte de outras coisas que nem ao menos
nomeamos.
Coisas sem nome. Somos e estamos
presos nas palavras que nem sequer ousamos dizer. Atravessar fronteiras é pisar
em lugar estranho e tudo que é estranho pode nos engolir (ou não!).
O corpo deitado na cama encolhido
em forma de feto e com temor da inércia – contra a qual brigo todo dia.
Inventamos junto com a fronteira, o conflito. E inventamos a saída de incêndio
e a tal luz no fim do túnel, os escapes, as escapadelas, a porta dos fundos e o
porão.
Somos bons em fugir. Precisamos
correr (coelho de Alice) a hora sempre chega.
Ananda Sampaio***
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