23 de março de 2015

No ônibus

A felicidade é uma velha bêbada, pensei. Essa frase se soergueu em minha mente enquanto vinha dentro do ônibus.(Andar de ônibus foi uma das sensações de maior liberdade e medo que senti. Andar de ônibus me ensinou a disfarçar o medo, me ensinou um pouco sobre como manter as aparências em situações de pânico).

Enquanto estava dentro daquele enorme transporte consegui pensar sobre as coisas práticas e não práticas do meu dia, ou melhor, dos meus dias. O vai e vem das pessoas transmitia sempre a sensação de controle, de fluxo, de máquina com engrenagens bem ajustadas. E, assim, eu podia relaxar rememorar minhas tarefas, pensar em frases estranhas, reavivar sentimentos e me dedicar a sentir. Durante uma época a paixão circulava pelas minhas veias e meus olhos enxergavam um mundo melhor. De repente, tudo parecia ter jeito. De repente, tudo poderia florescer.

O meu coração se descolava do peito a cada batida. Minha caixa torácica não parecia suportar os pulos apaixonados. E aí essa frase veio: a felicidade é uma velha bêbada. (E nesse tempo, ainda não conhecia Bukowski). Todo o torpor, todo o álcool com seus efeitos e dimensões – era a felicidade. Um efeito, uma química, uma leveza... Mas estava velha demais, cansada demais. Não poderia se perdurar muito naquele estado. O corpo precisa ser preservado, às vezes, de tanta felicidade.

Mas a felicidade não aceita conselhos.Ela precisa se expandir, invadir as célular e dissolver-se no universo, como uma estrela no fim. Ela precisa estreitar os laços e marejar os olhos de ondas. 


Você é o lugar mais bonito que já pude estar, digitei na mensagem de texto do celular. Não era S.O.S, mas um SMS. Naquele lugar que me encontrava jamais necessitaria de socorro. Só de espaço, muito espaço. Espaço onde coubesse tudo. Tudo aquilo, que parecia nuvem, que parecia bruma... Que parecia pedra e que parecia sal.

A felicidade é tua mão, e teu olho direito mais baixo quando ri. Pensava enquanto olhava pra ele nos meus pensamentos.

 No mar dos meus dias existia um farol. Num lumiar ritmado – como um vaga-lume. Estou certa de que era tu. Um farol, como um olho que abre e fecha, abre e fecha. Como um coração que aperta e solta, aperta e solta.

O coração que bate dentro da minha casa é teu. E essa é minha maior fragilidade, meu desengano.  A felicidade é uma velha bêbada sorrindo de histórias repetidas sobre os incontáveis dias de sol e chuva.

Ananda Sampaio


Um comentário:

Tempos de Aracne disse...

Se a "felicidade é uma velha bêbada sorrindo..." Quem seria a tristeza?